DIA INTERNACIONAL DA MULHER. ESTUPRO E DOR NA ALMA
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Luiz Carlos Formiga |
Neste dia Internacional da Mulher
permitam-me iniciar, com a “paz dos laboratórios e dos livros”, lembrando
Johanna (*) a quem presto homenagem.
Nem tudo são flores.
Neste março de 2018, Carmem Lúcia, a presidente
do Supremo Tribunal Federal, disse que a insegurança faz o cidadão não confiar
no seu País e no seu Estado. Ela se lembrava do assalto que sofreu em sua
cidade natal. No interior de Minas Gerais.
(1)
Comemoramos o Dia Internacional da Mulher
e por isso, debater projetos de interesse da bancada feminina no Congresso é uma
feliz iniciativa.
O projeto de lei que aumenta a pena prevista
para o estupro coletivo passou na Câmara, mas ainda vai ser examinado pelo
Senado. Por outro lado, hoje, véspera do Dia Internacional, três projetos,
considerados prioritários pela bancada feminina, já foram aprovados.
Essas propostas, que já foram também aprovadas
no senado, preveem medidas que aumentam a proteção da mulher e o combate à
violência. (2)
Qual a importância
desses projetos?
Outros projetos
sobre a educação da alma, “que é a alma
da educação”, parecem ainda negligenciados. Certamente eclodirão neste
terceiro milênio. (3)
Como seria bom
se encontrássemos uma maneira de impedir que mulheres se tornassem “famintas de
deixar de sentir dor”.
Estou falando da
“dor na alma”. Aquela que sentiu o sapo.
“O escorpião, venenoso, insensível; manipulador, perverso, aproximou-se do sapo, que estava à beira
do rio. Como não sabia nadar, pediu carona para chegar à outra margem.
Desconfiado, o sapo respondeu: – Ora, escorpião, só se eu fosse tolo demais.
Você é traiçoeiro, vai me picar, soltar o seu veneno, e eu vou morrer.
Mesmo assim, o escorpião
insistiu, com o argumento lógico de que, se picasse o sapo, ambos morreriam. Com
promessas de que poderia ficar tranquilo, o sapo cedeu, acomodou o escorpião em
suas costas e começou a nadar. Ao final da travessia, o escorpião cravou o seu
ferrão mortal no sapo e saltou em terra firme.
Atingido pelo veneno e já
começando a afundar, o sapo, desesperado, quis saber o porquê de tamanha
crueldade. E o escorpião respondeu friamente:
– Porque essa é a minha
natureza!”(4).
Senti “dor na
alma” quando tomei conhecimento de que um Procurador de Justiça declarou que
considerava o estupro praticado pelo réu uma “cortesia” e não um crime. (5)
“Dor na alma” sentirá o leitor ao examinar
o livro “Fome” de Roxane Gay. Professora universitária, ela tem suas colunas
publicadas regularmente no The New York Times e
no The Guardian. A escritora expõe suas entranhas “faminta
de deixar de sentir dor”.
Na brutal autobiografia conta como o
trauma de ter sido violentada aos 12 anos mudou sua visão (e espaço) no mundo.
Ela mergulhou numa espiral de vergonha,
culpa e ódio contra si mesma, que derivou na obesidade mórbida que sofre.
“Às
vezes sinto como se o passado pudesse me matar. É uma carga muito pesada. Na
minha história de violência houve um garoto. Eu o amava. Ele e vários dos seus
amigos me estupraram na floresta, numa cabana de caça abandonada, onde ninguém
podia ouvir meus gritos.”
Gay nunca havia denunciado ou
compartilhado com seus entes queridos a agressão sexual coletiva que sofreu.
Seu silêncio se fundiu com a autodestruição do seu corpo para criar um escudo.
“Comecei
a comer para mudar o meu corpo, é algo que fiz de maneira intencional”.
Seu auge foram 262 quilos (1,90 m altura),
para enterrar o estupro coletivo, antes de se recusar a se submeter a um bypass gástrico.
“Na minha vida há um antes e um depois de me
estuprarem”.
“Destruíram-me
e, para entorpecer a dor daquela destruição, comi, comi e comi”.
“Comi
porque achei que, se meu corpo se tornasse repulsivo, poderia manter os homens
afastados.”
E o estuprador?
Ela faz pesquisa Google com o nome daquele
que liderou a agressão em grupo contra ela. Sabe, pelas redes sociais, que
aparência tem, onde trabalha e que carro dirige.
“Pergunto
se sabe que penso nele todos os dias. Ele sempre está comigo. Sempre.”
“Não tenho paz.”
Pasteur recomendou a seus alunos que
procurassem a paz do laboratório e dos livros. Roxane Gay encontrou o livro.
Que ela receba de nós as melhores vibrações de paz. Sabemos que ela está
magoada demais para iniciar a prática da “Terapia do Perdão”. (6)
Que ela possa encontrar a paz no Cristo
Consolador. (7)
(*) Johanna Liesbebeth Kubelka Döbereiner (1924-2000)
A
agrônoma realizou pesquisas fundamentais para que o Brasil se tornasse um
grande produtor de soja, além de ter desenvolvido o Proálcool. Estima-se que
suas pesquisas fazem com que o nosso país economizem 1,5bilhões de dólares
todos os anos, que seriam gastos em fertilizantes. Seu estudo sobre fixação de
nitrogênio permitiu que mais pessoas tivessem acesso a alimentos baratos e lhe
rendeu uma indicação para o Nobel de Química em 1997. Sétima cientista
brasileira mais citada pela comunidade científica mundial.
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4. Ana Beatriz Barbosa Silva, Mentes Perigosas: O Psicopata Mora ao Lado. São Paulo, Globo,
2014, 232 p.